Foto: acervo pessoal Raphael Pachini
A música é um grande veículo de comunicação, e com o Rap não seria diferente. Embora o gênero tenha saído das favelas e ganhado o cenário nacional, algumas letras ainda tratam de temas de conscientização e trazem um discurso que é basicamente um protesto social.
Através dessa vertente musical que habita dentro da cultura hip hop, surgem as batalhas de rima. As batalhas funcionam como um treino para os novos MCs que têm a oportunidade de aprimorar o seu freestyle, raciocínio rápido, dinamismo e agressividade. O projeto tem como objetivo fortalecer a cultura urbana através do incentivo à produção coletiva da arte cantada.
As batalhas são identificadas por dois tipos: a de sangue e a de conhecimento. Diferente do que se acredita a batalha de sangue, mesmo que agressiva, é um momento de extremo respeito entre os adversários, sendo proibidos alguns tipos de assuntos, como homofobia, racismo e ofensas aos membros da família. Por isso que estas mesmas batalhas são vistas tal como um esporte de luta, onde se entra sabendo que você irá bater e apanhar, mas que o vencedor será o que estiver melhor preparado para a situação. Este preparo está ligado a conhecer o seu adversário, o público que estará presente naquele dia – pois são eles os principais juízes da batalha – o ambiente em que está e o momento em que sua rima deixará de ser rica para ser apelativa. As batalhas de conhecimento funcionam como uma aula de história e cultura, onde são debatidos temas socioeconômicos, políticos, religiosos e educacionais. Os temas são sorteados e o MC que apresentar a melhor rima com coerência, ritmo e que não fuja do tema, vence. Conhecer uma batalha de rima vai além de entendê-la. Para conhecer uma batalha precisamos conhecer os organizadores e produtores do evento e a sua proposta a partir dele, precisamos conhecer os MCs, a sua forma de criar, as suas motivações e ideais. É necessário também identificar a proposta cultural destes eventos e salientar de que forma eles agregam na formação de novos artistas.
Os responsáveis por trazer as batalhas de rima para São Paulo são os amigos Marcello Gugu e Flow MC, que se inspiraram nas batalhas que rolavam no Rio de Janeiro. “A Batalha do Santa Cruz só existe por causa da Batalha do Real. A gente copiou a Batalha do Real na cara larga e depois a gente foi adaptando para as nossas regras, para a nossa realidade" disse Marcello Gugu. A Batalha do Santa Cruz foi a primeira batalha da cidade de São Paulo e hoje, depois de 8 anos, atrai novos frequentadores todos os sábados na saída do metrô. Caracterizada como batalha de sangue, o evento atrai olhares assustados e preconceituosos “No começo eles (policiais) ficavam lá olhando, mas agora é tranquilo. Existiram uma ou duas vezes que eles entraram para ver o que era. Teve uma vez que eles até subiram de moto na rua” completa Gugu falando sobre o preconceito que ainda existe com o público amante de rap.
Em uma roda com dezenas ou centenas de pessoas os MCs se xingam, se abraçam e riem juntos, porque o objetivo não é criar inimigos, mas promover a cultura através da arte. Sobre batalhar com amigos, os MCs não se esquentam "É até melhor" diz Matheus Moreira, MC de batalhas que há um ano e meio frequenta os eventos.
Ainda em São Paulo e não muito longe dali, existe a Batalha Racional-Sexta Free, que acontece todas as sextas feiras na esquina da Av. Paulista com a Rua Augusta e acaba de completar 3 anos de existência.
"A gente queria um lugar bacana para fazer as batalhas e escolhemos aqui porque é onde o capitalismo se concentra, e nós viemos ara confrontar o sistema que tem os seus padrões normativos. Essa é a razão da gente existir" diz Will Smith MC, fundador e organizador da Sexta Free.
É muito comum os MCs participarem dos dois tipos de batalha, aliás é importante que eles tenham esse costume, pois assim adquire-se mais dinamismo no pensamento e isso, por vias, os deixam mais preparados. São poucos MCs que têm essa aptidão de batalhar nos dois tipos de batalha.
Nos dois tipos de batalha existem os apresentadores, mas para cada uma é desenvolvida uma tarefa diferente. Nas batalhas de sangue o apresentador tem a tarefa de colocar fogo no duelo e incitar a criatividade e a raiva dos MCs. Já nas batalhas de conhecimento o apresentador trabalha como um "lapidador" passando informações básicas para os MCs que não estão por dentro do tema proposto. Nas duas batalhas existe um tempo limitado para cada MC e é o apresentador que determina a hora de parar.
Para as duas batalhas existem regras básicas a serem seguidas:
Não pode haver xingamentos que atinjam a etnia, condição sexual, religião ou família. Para as batalhas de conhecimento existe mais uma regra importantíssima: nunca sair do tema proposto.
Para que os MCs cheguem às batalhas com um bom repertório linguístico e situados sobre a atual situação do mundo, os organizadores das batalhas dão algumas dicas que vão de ler revistas e dicionários até assistir programas de tv e acompanhar blogs. Claro que, cada MC trabaLha da maneira que melhor o convem, mas seguir as dicas de quem entende do assunto sempre é válido. Bula de remédios também entra na lista.
O vencedor da noite é escolhido no grito. O apresentador pede para o público fazer barulho para o MC que mais agradou e assim é feito durante os 3 rounds da batalha. Além de ir para casa com a sensação de dever “cumprido” o MC ainda leva o troféu da noite. Existe uma folha, feita a mão, onde consta desde a inscrição do MC, passando pelas “etapas” da batalha até o nome do vencedor. Essa folha é a prova de que você esteve lá, participou e ganhou. Fique atento nas batalhas que acontecem em São Paulo e, se houver alguma perto da sua área vale a pena conferir.
Domingo: Batalha do Parque - Parque da juventude
Segunda-feira: Batalha da Dois - Itaquera
Terça-feira: Batalha da Conc – Sangue – Estação Conceição
Quarta-feira: Batalha da Roosevelt – Praça Roosevelt
Quinta-feira: Batalha do Campo Limpo – Praça do Campo Limpo
Sexta-feira: Sexta Free – Av Paulista x Rua Augusta
Sábado: Batalha do Santa Cruz – Estação Santa Cruz